A minha experiência numa sala de partos
O parto é, sem dúvida, aquilo que as mulheres mais temem. Sobretudo, quando é o primeiro filho. Temem o desconhecido, essencialmente, mas também temem a dor.
Pessoalmente, sempre apregoei a altos ventos que nunca iria querer epidural. Porque mimimi e a dor não seria como partir uma perna e mimimi sou resistente à dor e mimimi era algo porque queria passar e vários outros mimimis.
Isto manteve-se até ser a única pessoa a levantar a mãozinha na formação de epidural promovida pelo Hospital de Gaia. Disse-me a senhora anestesista, fitando-me longamente: "Estou a memorizar o seu rosto. Caso seja eu a estar de plantão no seu parto, já sei que posso ir tomar um cafezinho." Ri-me com ela, claro, e saí de lá convencida que de facto não vale o sofrimento e que mais valia levar com a agulhona no lombo.
Mas, avancemos que vocês têm mais o que fazer.
Lembro-me perfeitamente de ter acordado na madrugada de 3 de dezembro, com uma pontada aguda nas costas. Não que fosse incomodativa, ou lancinante, foi mesmo só o suficiente para me acordar, virar para o outro lado e voltar a adormecer.
Nessa manhã tinha consulta de termo, o CTG não acusou grandes contrações e ainda tive que enfardar um docinho para obrigar o puto a mexer-se. No gabinete, as mãos engenhosas de senhora doutora detetaram 3/4 dedos de dilatação, deu um jeitinho (palavras da própria) desejou-me bom almoço e despediu-se com um "até logo".
Almocei sossegadita, na companhia de senhora minha tia, umas pataniscas absolutamente divinais. Contrações: 0.
Por volta do meio da tarde, comecei efetivamente a ficar incomodada, com a dormência que sentia. E dormência é mesmo o termo, não eram dores agudas, era só uma moinha que ia e vinha. Liguei ao homem, que a coisa já dava para contar os minutos de intervalo (15) e combinamos ir ao hospital quando chegasse. Dei um jeito à casa, estendi e apanhei roupa, fiz o jantar. Ainda insisti para o homem jantar, mas ele insistiu em irmos diretos para o hospital.
Entrei nas urgências às 19:45, pelo meu próprio pé, sem dores de maior a não ser uma pontada nas costas. Estava muito bem de pé, a caminhar então nem se fala, mas mesmo bem era agachada. Senhora enfermeira da triagem disse serem contrações posteriores, daí a dor nas costas, e que portanto seria um parto mais demorado.
Resignei-me à minha sina e fui recambiada para o CTG, que me custou horrores por ter que estar sentada, que acusou trabalho de parto.
No gabinete, com uma médica e um estagiário, calhou-me ser o jovem aspirante a obstetra a fazer o "toque".
Revela ele:
- Tem nove centímetros de dilatação, há só aqui blá blá blá.
Oi? Nove?! Como assim nove?! Este gajo não está a ver isto bem! Alguém que chame o seu supervisor para lhe ensinar a ver isto direito.
- Desculpe, eu não quero parecer arrogante, mas não quer chamar alguém com mais experiência? Eu não posso ter nove de dilatação, não tenho dores para isso.
Nesse preciso momento, entra em cna a médica que acompanhava, com ar de quem tinha efetivamente mais experiência, fazendo-me a vontade e revendo a dilatação.
- É um facto, tem nove centimentros de dilatção. Mas não lhe doi, é?
- Não é não doer, é só ser suportável. Claro que nesta posição sinto mais, mas a caminhar estou muito bem.
Gargalhadas por parte dos sôdotores, chamadas para o bloco de partos que ia subir uma utente quase em fase de expulsão e pedido de cadeira de rodas.
- Não é para mim, pois não?
- É pois, não vai a caminhar para cima.
- Vou pois.Se já caminhei até aqui, caminho mais um bocadinho.
- E se lhe rebentam as águas?
- Dou uma corridinha num instante.
Ainda insistiram naquilo mais um bocadinho, mas eu bati na mesma tecla e venci pela escassez de tempo.
Já no bloco, a coisa foi muito mais rápida: ainda eu estava a pôr um pé dentro e já me perguntavam porque ainda estava vestida.
E a epidural, perguntam vocês?
Pois que a pedi. Não que, como já referi, sentisse demasiada dor, mas pelo receio de que a coisa piorasse, eu me desconcentrasse da respiração e tivesse meia dúzia de piripaques nervosos. Não daria jeito nenhum naquela hora. Consegui aguentar quieta o tempo necessário à colocação do cateter - não perguntem como, surtiu grande admiração por parte dos médicos assistentes.
Posso afiançar que não surtiu grande efeito: senti com bastante realismo o golpe da tesoura.
De modos que foi um parto relâmpago e com pouquíssima dor. Pela parte que me toca, digo-vos: não custa mesmo nada. Já fiz coisas mais dolorosas, como burpees, por exemplo.